Pesquisar este blog

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Chuvas numa sexta-feira - Gilberto Costa



Todo dia bom no Sertão do Seridó é dia de chuvas. E se for numa sexta-feira e à noite, então, nem se fala. E se faltar energia e a escuridão for suprida por uma lamparina, é indescritível!

Chuvas em uma sexta-feira torna a feira do sábado mais alegre. Os seridoenses se esbaldam em suas fabulações e as vozes se impostam além do normal. E tome histórias de chuvas e previsões de um bom inverno. As manifestações de crenças se multiplicam. Os homens tiram seus chapéus, trazem para lado esquerdo do peito e olham para o céu. As mulheres juntam suas mãos e fazem gestos de preces. Todos agradecem a Deus por atender suas orações.

Hoje, antes de ir à feira livre, percorro cedinho os caminhos da caatinga. Por algum momento, destino meus ouvidos à percussão dos chocalhos do gado no pasto e o aboio dos vaqueiros. É incrível a sintonia entre os envolvidos! Eles não destoam. E não tem como ficar alheio à passarada. Como demonstra felicidade os pássaros, ainda com suas penas pré-aquecidas, ensaiando voos e preparando seus bicos para o canto matinal! Escuto barulho de água escorrendo pelas ribanceiras. Agora sei por que, quando criança, deixava-me conduzir por esses sons e me perdia no meio do mato.

Abro os olhos. Preciso saber como estão as flores dos cardeiros. Vagueio por onde imagino encontrá-los. Lá estão eles como se fevereiro fosse a primavera! E como mudam com as chuvas nossos resistentes cardeiros! Até aqueles que parecem sucumbir estão a florir! E eles não se fazem sós. Há companhias. O Sertão do Seridó começa a mudar sua tonalidade.
Olho para cima. O sol ainda não deu as caras. Hás razões para tanta preguiça. Hoje ele pode acordar mais tarde.

Percorro o caminho de volta. A feira me espera. A euforia na feira livre do sábado segue com as comemorações. As banquinhas com caldos, paneladas, buchadas e fritadas de carneiro atraem os compadres e as comadres para os festejos. E as lapadas de cachaça e conhaque de alcatrão com limão se multiplicam. E logo aparece um sanfoneiro com seu fole tocando um xote. E o som das zapragatas de couro faz coro com o canto e as vozes animadas.
É assim quando chove no Sertão do Seridó!

Por Gilberto Costa - escritor e poeta caicoense 

Nenhum comentário:

Postar um comentário